Há factos que nada abonam em favor da nossa cultura, já não digo geral, mas literária. Um deles é, seguramente, só saber da existência dum escritor francês - digo francês, porque a França é mesmo ali à esquina e, até há relativamente poucos anos, pode dizer-se que a vida cultural portuguesa foi tributária da congénere francesa... -, através da notícia de que lhe foi atribuído o Prémio Nobel da Literatura!
Aconteceu-me isso com Patrick Modiano, beneficiário, em 2014, deste prémio (ia escrever galardão, para não repetir prémio, mas detesto a palavra, demasiado barroca...).
Para além de curiosa, senti-me quase obrigada - perante mim própria, entenda-se! - a correr à Bertrand mais próxima, com o objectivo de suprir tão incómoda lacuna. Acabei, assim, por adquirir O HORIZONTE (Porto Editora), para o qual só avancei há duas semanas, após ter vencido uma inexplicável resistência, desaconselhadora de grandes expectativas, e duas tentativas falhadas (em que não passara das primeiras páginas).
Devo confessar que me custou vencer o horizonte dessas páginas e de muitas mais, aí até metade do romance, onde, finalmente, comecei a surpreender alguma história, numa narrativa errante, tão errante quanto o assunto sobre que versa, a memória, aliás, uma particular categoria de memória, se assim se pode dizer. Nesse aspecto, devo reconhecer uma assinalável consistência - ignoro se intencional ou acidental, embora me incline para a primeira - entre a forma e o ritmo da narrativa e as vagas difusas mas impressivas daquela memória, que parece erigir-se em personagem-líder, ao comandar a vida (vazia) do protagonista, enchendo-a de fragmentos dum passado incumprido (aquém do horizonte, portanto), e impondo-lhe a necessidade (ou será obsessão?) de os reconstituir e, mais, de os redimir, na ideia do cumprimento dum futuro susceptível de ajustar contas com aquele passado, reeditando-o no presente. O que, aliás, é deixado em aberto. Como convém.
Mas será essa consistência suficiente para fazer de O HORIZONTE um romance maior, ao nível dum Autor nobelizado? Não creio. A utilização daquela particular ideia de memória, se bem que interessante, não me parece, propriamente, original. Por outro lado - e mais relevante - as personagens e a sua história carecem, a meu ver, de espessura e profundidade, não suscitam empatia (positiva ou negativa) suficiente para despertar no leitor aquele interesse que o conduz a uma reescrita, para si, da obra alheia, para assumi-la como património seu, ainda que no plano abstracto duma (eventual) partilha de identificações. Também o estilo - cuja qualidade, aliás, não questiono - e o pensamento - longe de atingir profundidade assinalável - não me conduzem ao reconhecimento duma característica maior neste romance.
Obviamente, não sendo um livro que faz um Autor - nem, de resto, um leitor -, reservo-me opinião mais fundamentada sobre Patrick Modiano para quando tiver lido mais uns livros seus (não que, de momento, me apeteça muito...).
Obviamente, não sendo um livro que faz um Autor - nem, de resto, um leitor -, reservo-me opinião mais fundamentada sobre Patrick Modiano para quando tiver lido mais uns livros seus (não que, de momento, me apeteça muito...).
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