NUM OUTONO TINGIDO DE PRIMAVERA (OU SERÁ VERÃO?)
quinta-feira, 17 de outubro de 2013
quarta-feira, 16 de outubro de 2013
sexta-feira, 11 de outubro de 2013
terça-feira, 8 de outubro de 2013
DICIONÁRIO PARA LORPAS (1)
ESPÉCIE DE INTRODUÇÃO
Quando penso que a minha capacidade de espanto já atingiu o limiar absoluto, volto a espantar-me! E é sempre difícil aceitar o fracasso dum novo limiar despedaçado.
Outro fenómeno que me atinge frequentemente é a consciência da minha crescente ignorância, como se quanto mais devesse saber, menos soubesse! Obviamente, também não é fácil de aceitar, ao menos para alguém como eu, para quem atingir a compreensão/conhecimento da realidade envolvente (humana ou não) constitui um anseio, vindo sabe-se lá donde e conduzindo sabe-se lá a quê, porventura a nada de importante, mas isso não é para aqui chamado.
E o que tem isto a ver com um DICIONÁRIO PARA LORPAS ? Tudo a ver!
Passo a explicar: de há uns tempos a esta parte, várias pessoas, eu incluída, temos vindo, se não a considerar-nos lorpas - por vezes, também - a admitirmos, como hipótese segura, que certas outras pessoas nos tratam como se o fossemos, aliás, em elevado grau, perdidamente lorpas. Estas outras pessoas, talvez melhor dito, personagens ou mesmo personalidades, reconduzem-se, sobretudo, à categoria dos chamados políticos, vocábulo que, embora indevidamente, se deu em aplicar aos governantes - indevidamente, porque, por regra, o conceito de política assume um significado demasiado elevado para designar as práticas a que esses senhores ou senhoras se dedicam -, mas também a outras categorias, como é o caso dos comentadores e dos banqueiros. Há mais, mas refiro-me, apenas, às óbvias.
O citado tratamento por lorpas consiste na utilização intencional de certos vocábulos ou fraseados destinados a camuflar realidades desagradáveis - para não dizer dramáticas - que nos impõem, mas não estão interessados em assumir.
Também pode ser visto como um jogo parvo de enganar criancinhas, como quando se diz pica em vez de injecção ou coisas do género.
Então, como ninguém gosta - parece-me, mas posso estar enganada - de se ver tratado como lorpa - ou porque não o é ou porque, sendo-o, devia estar ao abrigo duma qualquer benemérita ONG, v.g., APPL, Associação para a Protecção de Lorpas - decidi dar-me ao trabalho de identificar os vocábulos ou fraseados de que falo acima e a estabelecer o seu real significado.
Faço-o com o intuito duma modesta contribuição para a erradicação do fenómeno de lorpização nacional, sem quaisquer fins lucrativos.
Tratando-se de matéria muito vasta, talvez haja continuação do trabalho agora iniciado, mas nada garante que assim seja, visto ter outras aplicações, bem mais interessantes, para o pouco tempo de que disponho. A ver vamos, pois, se ao 1 se seguirá um 2 e por aí adiante.
Só mais uma coisinha: sob o ponto de vista alfabético, a ordem é puramente arbitrária, pois, como se compreende, estou condicionada pelo que vou ouvindo.
DICIONÁRIO PROPRIAMENTE DITO
- CHOQUE DE EXPECTATIVAS (no contexto do próximo Orçamento de Estado, conforme utilização por sua exc.ª o senhor 1º ministro): REALIDADE DE CONFRONTO, geradora dum CHOQUE DO CARAÇAS (em linguagem coloquial lorpa) NOS DESTINATÁRIOS DAS MEDIDAS alegadamente destinadas à redução do défice, imposta pela corja de credores e pelo voluntarismo do governo, traduzidas, nomeadamente, em MAIS UM ASSALTO AOS TRABALHADORES E AOS REFORMADOS E EM MAIS UMA FORTE MACHADADA NA CLASSE MÉDIA EM VIAS DE EXTINÇÃO (ou já extinta, de todo, admito não estar 100% actualizada). Mas também susceptível de gerar esfregadelas de mãos e sorrisos marotos a suas excs.ª os senhores banqueiros nacionais, cujo financiamento, via grande parte do célebre (1º) resgate, está a ser pago pelos acima citados, lorpas.
- INCORRECÇÃO FACTUAL (no contexto das explicações dadas por sua exc.ª o senhor ministro dos negócios ... está bem, estrangeiros, a propósito da magna questão de ser - como, pelos vistos, era - ou não ser - como, pelos vistos, disse - sócio da fantasmagórica SLN): MENTIRA DESCARADA OU DO CARAÇAS (em linguagem coloquial lorpa), susceptível de fazer o nariz de qualquer Pinóquio ultrapassar as fronteiras da pátria Itália e chegar sabe-se lá onde ou de deixar desdentada a mais bem artilhada das bocas. Mas também e por isso, CAUSA DE DEMISSÃO IMEDIATA NUM PAÍS QUE NÃO FOSSE DE LORPAS.
- FORMA MENOS FELIZ (referida ao pedido de desculpas apresentado pela mesma excelência ao Governo de Angola, pelo facto de, ao que parece, a justiça portuguesa ter uma investigação em curso sobre um ou mais angolanos, não sei bem): SUBSERVIÊNCIA DO ESTADO PORTUGUÊS, teoricamente democrático, FACE AO ESTADO ANGOLANO, também teoricamente democrático, em nome de desprezíveis interesses da alta finança luso-angolana, À REVELIA DOS LORPAS.
- VÍTIMA DUMA CAMPANHA (segundo alegação da mesma excelência, no contexto das críticas das oposições aos seus referidos comportamentos, pelo menos): CHAMADO A RESPONDER, CÍVICA, POLÍTICA E JUDICIALMENTE, SENDO O CASO, EM VIRTUDE DE ACTOS PRATICADOS NA QUALIDADE DE GOVERNANTE.
sábado, 5 de outubro de 2013
"CAVALOS ROUBADOS"
Um sexagenário avançado (67 anos), após 3 anos à deriva, na sequência da perda dos seus referenciais humanos mais próximos, a mulher e a irmã, decide passar o tempo que o separa da morte (assim vê, realisticamente, a situação) no isolamento duma casa perdida num remoto bosque norueguês, frente a um lago.
A realização das obras de restauro requeridas pela casa é a tarefa que elege para si próprio, como quem precisa de aproveitar e, simultaneamente, de demonstrar as últimas forças. Ao mesmo tempo, vai reflectindo, com pungente lucidez, sobre a velhice.
A sua ideia é a autonomia, a sua escolha, o retiro da solidão.
Enfrenta, pois, com desagrado a descoberta dum vizinho, um pouco mais novo, que lhe parece conhecer doutro tempo, como conhece.
Esse outro tempo remonta à adolescência, ao Verão dos seus 15 anos, passado na companhia do Pai - amado, admirado e emulado -, numa cabana perdida em remoto bosque norueguês, atravessado por um rio.
Circunstâncias de ordem vária, sobretudo de entreajuda, levam à aproximação com o vizinho, pretexto para uma tão nostálgica quanto vibrante revisão daquele período da sua vida e dos estranhos e intensos acontecimentos então ocorridos, em que ambos, cada um à sua maneira, são protagonistas relacionados.
E assim se vai construindo uma trama entre o passado e o presente, cuja malha é a das mais profundas emoções e da mais obstinada dificuldade na sua demonstração, como se, por exemplo, expor os afectos carregasse em si uma funesta consequência.
Nisto ele é mestre, ele, PER PETERSSON, de cujo livro CAVALOS ROUBADOS estou a falar. Já o tinha constatado ao ler MALDITO SEJA O RIO DO TEMPO (como aqui testemunhei, em post de 20 de Agosto de 2013, intitulado, BLESSED BE PER PETTERSON).
O estilo é, também, idêntico, primando por uma escrita descritiva, tão viva quanto poética, que nos leva a desejar voar pelas páginas como quem rouba cavalos.
Enfim, mais um livro magnífico, profundo, envolvente e confirmativo de que a sensibilidade (no sentido do entendimento da emoção) não é um domínio exclusivamente feminino.
quinta-feira, 3 de outubro de 2013
quarta-feira, 2 de outubro de 2013
NOVOS JUDEUS? NOVOS NEGROS?
E se, de repente, um ser humano desatasse a varrer para o lixo as emoções que produz e com as quais não quer, não sabe ou não consegue enfrentar-se? E se, não satisfeito com tal acto de pura e dura rejeição, determinasse arbitrariamente, convicto dum qualquer insondável poder e artilhado com a ignorância das ignorâncias, a insensibilidade das insensibilidades e a brutalidade das brutalidades, que essas emoções deveriam ficar eternamente confinadas ao abandono do lixo para onde as varreu? E se, para cúmulo, se vangloriasse do seu acto, atribuindo-lhe como justificação, não querer ser contaminado pelas ditas e pretender defendê-las sabe-se lá de que ameaças, coitadas, grande consideração?
Entendo que, se tal sucedesse, esse ser humano (?) só podia estar doido, completamente desfasado da sua própria realidade, parte da sua essência, pela qual é responsável e que necessita compreender para se compreender e poder interagir com os seus semelhantes. Tal comportamento estaria, em minha modesta opinião, muito para além da mais aterradora ignorância, insensibilidade, estupidez, arbitrariedade, maldade, como se lhe queira chamar. Tratar-se-ia de loucura.
Então o que dizer duma sociedade que produz aqueles despojos humanos - todavia, não despojados de alma e humanidade - aos quais, mais ou menos clinicamente, convencionou designar de Sem-abrigo? Que se desresponsabiliza deles, ignorando-os, enxotando-os, varrendo-os para o pior dos lixos (para ser mais realista)? E que, para cúmulo, determina a sua criminalização e lhes estabelece zonas de interdição de acesso, como se fez, noutras alturas, não assim tão remotas, por exemplo, aos Judeus e aos Negros? E que se fundamenta na protecção de valores sociais (?) e, cúmulo dos cúmulos, na própria protecção dos visados, que, com a aproximação do Inverno, podem morrer de frio?
Quem não saiba do que estou a falar, julgará que entrei em delírio. Pois não. No caso, infelizmente! As medidas acabadas de referir - criminalização e delimitação de zonas de interdição de acesso aos Sem-abrigo - acabam de ser decretadas pelo Parlamento Húngaro, logo, num País europeu, no seio da União Europeia, no seio dum mundo onde, quanto mais não fosse, eu julgava vigorar uma Declaração Universal dos Direitos do Homem e estar ultrapassada a fase da mais negra das barbáries.
Esqueci-me de responder à pergunta que eu própria formulei. Faço-o agora: uma tal sociedade só pode ter ultrapassado as barreiras da mais aterradora ignorância, insensibilidade, estupidez, arbitrariedade, maldade, como se lhe quiser chamar, à luz de qualquer critério racional e decente. Uma tal sociedade só pode estar louca, perigosamente louca.
Como o estará qualquer sociedade que não reaja adequadamente a uma tal provocação da loucura.
Calhou-me ouvir esta notícia, hoje, na TSF, em mais uma magnífica crónica (Sinais) de Fernando Alves. Fiquei seriamente indignada e indisposta. E não podia deixar de me manifestar, ainda que só desta forma, visto não ter outra ao meu alcance.
Outros pensamentos me ocorrem.
Virá a lei a ser aperfeiçoada, mediante a criação de campos de concentração para os Sem-abrigo, onde os aguarda o destino que tocou aos Judeus, sob o alto patrocínio daquele louco e de todos os loucos que estiveram com ele e de todo um povo que se deixou ficar calado ou calar e de todos os outros povos que fingiram ignorar?
Quantos mais Martin Luther King(s), Nelson Mandela(s), Aristides de Sousa Mendes serão ainda necessários para confrontar a loucura do mundo?
Também tenho uma resposta: a loucura do mundo só será erradicada quando todos e cada um de nós for MLK, NM, ASM ou alguns outros (não muitos) que, de tempos a tempos, conseguem marcar a diferença, quais desvios correctores no percurso evolutivo da espécie humana. Depende, pois, de cada um de nós!
Enquanto escrevo, estou sentada frente ao Tejo, escurece, quase 20H, as luzes já brilham na outra margem e dou comigo a pensar: a quantidade de água deste maravilhoso rio, mesmo junta à do oceano em que se funde e à de todos os oceanos da Terra, não representa mais do que a ínfima partícula duma lágrima, comparada com as lágrimas que já correram, correm e hão-de correr neste mundo, ao menos enquanto se não erradicar esta forma de loucura, porventura a pior de todas.
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