Balzac e a Costureirinha Chinesa, da autoria de Dai Sijie, é um livro simplesmente delicioso! Conta-nos a história de dois adolescentes oriundos da burguesia intelectual chinesa, que, em plena Revolução Cultural, ao mando do Grande Timoneiro Mao Tsé-Tung, são desterrados para uma aldeia suspensa no tempo e na montanha da Fénix Celestial, junto ao Tibete, a fim de serem reeducados às mãos de camponeses praticamente analfabetos e tacanhamente incultos (à chegada, o chefe da aldeia quase destruiu o violino dum dos rapazes, que confundiu com um simples brinquedo burguês, logo, objecto proibido pelos rigores da revolução...).
O percurso de (re)aprendizagem passa pelo cumprimento de duras obrigações, incluindo, nomeadamente, o trabalho nos campos e nas minas. Todavia, os talentos narrativos, sobretudo dum dos jovens, acabam por lhes render inesperada vantagem, ao transformá-los em veículos orais dos filmes que passam numa aldeia vizinha, introduzindo na aldeia a única modalidade de cinema aí conhecida, o, por assim dizer, cinema falado...
No percurso, surgem mais dois personagens-chave, uma jovem costureira, a costureirinha, filha do alfaiate da região, e um outro rapaz, também em reeducação. Com aquela surgem os mistérios do amor, com este revela-se um objecto proibido, altamente desejado pelos dois protagonistas, uma mala de livros de autores (ocidentais) clássicos, entre os quais, Balzac (sendo que, em matéria de livros, os comandos revolucionária apenas permitiam o Livro Vermelho...).
São, justamente, estes dois elementos que vêm a estabelecer o fio condutor da acção e a determinar o seu desfecho, pondo, nuclearmente, em evidência a magia e o poder da literatura. Isto, sem deixar de fazer sobressair um conjunto de (outros) valores, como a amizade, a entreajuda, o entusiasmo e o destemor da juventude, o poder de adaptação e de superação (só para mencionar alguns).
Mas, o que torna este livro verdadeiramente delicioso é, a par da fluidez e limpidez da escrita, a perspectiva adoptada na narrativa, duma pureza da ordem da quase inocência, duma leveza de pássaro distante, que, sem pretender branquear a rudeza da situação de partida - está lá, em toda a sua nudez -, coloca a tónica nos valores - da ordem dos acima mencionados -, que acabam por sobressair mesmo em situações limite e, logo, em contraponto aos seus opostos. Não esquecendo um fio de humor ou de brincadeira, que perpassa todo o romance.
Note-se que o Autor, nascido em Chengdu, Sichuan, China, em 1954, foi, ele próprio, colocado em reeducação entre 1971 e 1974. Mais tarde, veio a estabelecer-se em França, tendo publicado este livro em 2000. Em 2002, adaptou-o e levou-o, sob sua direcção, ao cinema.
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