E dizerem ao que vêm?
É verdade que, de momento, tudo gira à volta do Covid-19, o novo vírus a respeito do qual o pouco que se sabe parece reduzir-se ao elevadíssimo grau de contágio e perigosidade.
Acontece que esta realidade nova e desconhecida convive com realidades velhas e conhecidas de todos os dias, mesmo que estas, para se manterem à tona, tenham de cavalgar o malfadado bicho, como quem precisa de boleia para libertar seus vapores bafientos, únicos de que, simultaneamente, se alimenta e respira.
Refiro-me a todos os reacionários, saudosos da mesquinha ditadura derrubada pelo 25 de Abril e que, nessa qualidade, sempre estiveram intrinsecamente contra a respectiva celebração, mesmo faltando-lhes coragem para o assumir; os mesmos que, por semelhante ideário (quando o têm; alguns não parecem capazes de parir uma ideia que seja...), assumem idêntica postura no tocante ao 1° de Maio, por se tratar do Dia do Trabalhador, entidade que, também intrinsecamente, desprezam.
Esta fina flor anda em magno falatório e reboliço a insurgir-se contra as anunciadas celebrações dessas datas, sobretudo a primeira (sem cuja efeméride, aliás, inexistiria a segunda). Isto, alegadamente, em nome do perigo que, dado o Covid-19, o ajuntamento de pessoas representa.
Todavia e (não) curiosamente, tal fina flor tende a coincidir com a que, em nome dum ideário ultraliberal (na melhor das hipóteses!), se vem, igualmente, manifestando contra a política adoptada no nosso País para combate ao Covid-19, sobretudo contra a implementação do estado de emergência, propugnando, em contrapartida, a irrestrita circulação das pessoas (e, em consequência, do vírus, digo eu!), em nome da economia.
Eu e, certamente, muitos outros, que nada temos em comum com o ideário dos acabados de mencionar e que, pelo contrário, entendemos e defendemos a importância política e cívica da celebração das datas em causa — desde logo, no meu caso e no de tantos mais, porque vivemos a ditadura e não gostámos nem queremos que se repita –, também estamos contra a forma proposta, no corrente ano, para essa celebração. Isto, por entendermos que, face à política restritiva adoptada – em meu entender, bem – para combate ao Covid-19, não só carece de sentido como representa lamentável e perigoso mau exemplo, promover a excessiva reunião de pessoas. Tanto mais que desnecessária, porquanto, atentas as circunstâncias, a manutenção das comemorações seria compatível e deveria ficar-se por algo de meramente simbólico e, ao mesmo tempo, educativo (note-se, de resto, que os actos simbólicos costumam ser bem mais fortes do que os ostentatórios).
Assim sendo, o que nos distingue?
O que nos distingue é simples questão de princípio (e consequente legitimidade), a saber: o fundamento da nossa posição radica mesmo na ameaça/Covid-19 e na partilha duma hierarquia de valores que prioriza a pessoa humana sobre os interesses económicos; já o fundamento da posição dos primeiramente mencionados é o ódio que (de forma mais ou menos aberta ou expressa) sempre professaram ao 25 de Abril/1°de Maio e a partilha duma hierarquia inversa àqueloutra. De resto, nós estamos contra a forma proposta, eles contra o próprio acto.
E não estão no seu direito, perguntar-se-á?
Pois sim, também para isso se fez o 25 de Abril!!!
Mas, por favor, tenham coragem, digam ao que vêm, deixem de cavalgar o bicho mau para deitarem as garras de fora! Deixem-se de desculpas e populismos, assumam-se!
Mas, por favor, tenham coragem, digam ao que vêm, deixem de cavalgar o bicho mau para deitarem as garras de fora! Deixem-se de desculpas e populismos, assumam-se!
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